07/11/2011
A
funcionalidade e a diversidade da natureza, tão fascinantes quanto
quase imperscrutáveis, estão associadas à existência de uma estrutura
complexa, em que as partes estão em contínuo processo de interação.
Ante a desproporcional limitação da inteligência humana, sua
compreensão requer a construção de modelos que simplifiquem a
realidade, para compreendê-la e com ela interagir, a despeito dos
riscos de uma modelação simplista, desapegada da realidade e muitas
vezes fundada em apriorismos filosóficos ou religiosos.
À
medida que prospera o processo civilizatório, as relações sociais, em
sentido lato, tendem à complexidade, ainda que em escala infinitamente
menor se cotejada com os sistemas naturais.
O
elogio à genialidade de Steve Jobs ressaltou sua obsessão com a
simplicidade criativa. O primeiro folheto propagandístico da Apple
proclamava, acolhendo célebre frase de Leonardo da Vinci, que "a
simplicidade é a sofisticação máxima". Acrescentou Jobs: "O simples
pode ser mais difícil que o complexo. Você tem de trabalhar muito para
chegar a um pensamento claro e fazer o simples".
Sistemas
tributários correspondem a intervenções do Estado - em tese meritórias
- nas relações sociais, daí porque se vocacionam para a complexidade,
quando acriticamente se limitam a replicar, no âmbito do seu objeto,
relações sociais mais elaboradas.
A
complexidade tributária é custosa, ineficiente, controversa e produz as
trevas nas quais deambulam o burocratismo, que não raro inclui a
corrupção administrativa, e as diversas modalidades de alquimia
tributária, ao gosto da sonegação e da elisão fiscal.
A
iniquidade dos sistemas complexos foi denunciada por eminentes
tributaristas contemporâneos, a exemplo de Klaus Tipke, Casalta Nabais,
Richard Musgrave e Vito Tanzi. Há uma convicção generalizada de que a
demanda por simplificação se tornou universal e de que o caos
tributário não é propriedade de nenhum país.
A
reforma tributária de 1965 foi um extraordinário exercício de
simplificação, ao reparar - ao menos parcialmente - as imperfeições na
tributação do consumo, centralizar na União os tributos sobre o
comércio exterior e codificar a matéria tributária, sem descurar de
melhorias na administração fiscal.
Outro exemplo de iniciativa simplificadora foi a reforma do Imposto de Renda, empreendida na segunda metade dos anos 90.
A
eliminação da correção monetária, para fins fiscais, expurgou uma
aberração que tornava a legislação do Imposto de Renda brasileiro, além
de complexa, extremamente injusta, porque premiava as grandes empresas,
em escala progressiva, com a aceleração do processo inflacionário.
A
efetivação do lucro presumido, pela elevação dos limites de faturamento
para opção dos contribuintes e isenção na distribuição dos resultados,
elidindo uma virtual bitributação, produziu, singularmente, aumento de
opções e de arrecadação, constituindo uma solução que conciliou
interesses do Fisco e dos contribuintes.
A
instituição do Simples, em 1996, representou a mais significativa onda
de formalização de micro e pequenas empresas no Brasil, a despeito de
todas as deploráveis restrições burocráticas à constituição e baixa de
empresas, que ainda hoje perduram. Motivou, inclusive, a adoção de
modelos análogos estaduais, como o Simples Paulista e o Simples
Candango.
O
esforço simplificador, contudo, enfrenta obstáculos sucessivos. Muitas
vezes, o Fisco parece abominar a simplicidade. O contribuinte é visto,
nessa hipótese, como adversário. Quanto mais complexa e obscura a
legislação, maior a dependência à interpretação da administração
fiscal, fazendo sobressair a força corporativa.
Desse
modo, de tempos em tempos ressurge a demanda por indexação de tabelas
de impostos, esquecendo que esse instituto foi um dos principais
responsáveis pela inflação, que infelicitou o Brasil por um longo
período.
Desde
2002 não se revê o limite de opção do lucro presumido. Argumenta-se com
virtual perda de arrecadação, o que não corresponde à verdade. Nenhuma
vez em que houve elevação desse limite ocorreu diminuição de receitas.
No
Congresso Nacional tramitam projetos que pretendem estabelecer novos
limites, entre eles um de autoria do hoje vice-presidente Michel Temer.
Os parlamentares não devem demitir de si a discussão da matéria.
Foi
boa a intenção de unificar, no âmbito federativo, os diferentes regimes
simplificados de tributação das micro e pequenas empresas, com a
criação do Simples Nacional.
Aos
méritos da instituição do Microempreendedor Individual e da elevação
dos limites máximos de receita bruta para enquadramento no regime se
contrapõem a completa inépcia em relação à simplificação dos
procedimentos de inscrição e baixa de optantes, a desconcertante e
contraditória complexidade na apuração do imposto devido e a profusão
de normas emanadas pelo comitê gestor.
A
simplificação precisa se inscrever na agenda tributária brasileira em
caráter permanente. Não se pode esquecer de que a complexidade é
oportunista e de difícil erradicação. Everaldo Maciel - Consultor tributário, foi secretário da Receita Federal (1995-2002)
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