21/09/2009

Idosos têm direitos violados

Fonte: Diário do Nordeste
 
Iguatu. Apesar de conquistas como o Estatuto do Idoso e a criação de instituições de proteção social, os casos de desrespeito à terceira idade ainda preocupam. No Interior do Estado, muitas famílias vivem da aposentadoria dos parentes mais velhos e o dinheiro desses benefícios mobilizam o comércio nas pequenas cidades. É a partir daí que comerciantes e até parentes, que deveriam zelar pelo idoso, podem cometer violações, contando com a fragilidade e o desejo de manutenção do vínculo familiar da pessoa idosa para manter a impunidade.

Em Iguatu, o número de casos de violência contra a pessoa idosa se manteve estável nos últimos dois anos, segundo os registros do Núcleo de Atendimento ao Idoso com Direitos Violados do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas). Os casos mais comuns ocorrem no meio familiar e referem-se à problemas de exploração econômica, violência psicológica e física.

Desde 2005, Iguatu dispõe de uma rede de proteção ao idoso, a partir da implantação do Centro de Referência de Assistência Social (Cras) e do Creas, que trabalham em parceria com o Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa. A maioria das denúncias de maus-tratos é encaminhada por vizinhos, um parente sem vínculo e denúncias feitas por telefone.

Os profissionais que atuam no setor mostram-se preocupados com a violação de direitos da pessoa na terceira idade e analisam que a situação só vai melhorar quando os parentes forem sensibilizados e passarem a respeitar os direitos dos pais, avós e tios. "Os próprios idosos precisam e protegem o vínculo familiar, e não falam", observa a coordenadora do Núcleo de Proteção Especial do Creas, Maria Barbosa.

Em 2007, foram registradas 11 denúncias de violação aos direitos dos idosos. No ano passado, foram 42. Este ano, até o fim de semana passado, havia 38 queixas desse tipo. Deste total, quatro casos eram de violência física. "Atendemos a todas as ocorrências e conseguimos resolver em curto prazo a metade dos casos. Depois fazemos o acompanhamento", explica a assistente social do Creas, Lorena Nery Borges.

Benefício retido

A experiência mostra que a principal violação que o idoso sofre é econômica. Aqueles que estão em sua convivência ou donos de mercearias e supermercados apoderam-se do cartão de benefícios da Previdência Social. "Esse é o maior problema e é de difícil solução", observa Raimundo Neto de Carvalho, integrante do Conselho Estadual do Idoso. "Os aposentados confiam nos comerciantes, compram fiado e, nos casos dos parentes, ficam na dependência deles para ter dinheiro".

Segundo o conselheiro, é de conhecimento público que muitos mercadinhos do município estão com centenas de cartões de benefícios sociais. Com acesso às senhas, descontam na data certa os valores integrais e, ao longo do mês, fornecem mercadorias e dinheiro, com juros, aos idosos. "Essa detenção do cartão é um crime. Os idosos perdem sua autonomia financeira", observa.

Raimundo Neto de Carvalho já foi presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa e, por experiência, diz que 90% dos casos de violência ocorrem dentro de casa. "Os vizinhos é quem fazem a denúncia, mas quando vamos investigar, o idoso nega para proteger a sua família. Eles temem sofrer novos maus-tratos", contou.

Na avaliação de Carvalho, os conselhos municipais são frágeis e estão ligados às prefeituras. "É preciso cobrar políticas públicas de proteção à pessoa idosa e fazer valer o Estatuto do Idoso. Quando a sociedade conhecer melhor esses direitos, haverá mudança favorável para a terceira idade".

Sensibilização

A equipe do Creas, após o recebimento das denúncias, faz as visitas domiciliares para verificar a real situação do idoso. "Muitos só revelam o problema após longa conversa", disse Lorena Borges. "Conversamos com a família e mostramos as punições que a lei garante, mas tentamos sensibilizar e fazer com que eles parem com as agressões".

A coordenadora de proteção básica, Leuda Holanda Lavor, trabalha com ações preventivas e de proteção à pessoa idosa. "O nosso foco é evitar que o problema ocorra", disse. Já a psicóloga Ana Luíza Santos observa que o idoso que sofre mais agressão é o que está debilitado, sem condições de reagir. "Esses são os mais vulneráveis e necessitam de maior cuidado e compreensão. Mas muitos parentes não estão dispostos a fazer esse trabalho", disse. O Creas reúne várias situações de agressividade doméstica. "O nosso objetivo é fortalecer o vínculo familiar", disse Maria Barbosa. "Se isso ocorrer, já é meio caminho andado para reduzir a violência contra o idoso".

PERDA DE VÍNCULOS

Número de abrigados cresce


Quixadá. O diagnóstico real da situação enfrentada pelos idosos nas cidades do eixo central do Estado ainda é uma incógnita. Os números oficiais não condizem com o drama enfrentado por quem já atingiu o estágio mais avançado da vida. Entre delegados, juízes, assistentes sociais, psicólogos e religiosos, a opinião é praticamente unânime: o laço familiar é o principal fator para ocultação da violência enfrentada pelos idosos. Geralmente são os vizinhos e agentes de saúde que fazem as denúncias. Na maioria das vezes, esbarram no silêncio das próprias vítimas.

A Secretaria de Desenvolvimento Social de Quixadá aposta assistência aos mais velhos através de atividades programadas. A assistente social do órgão e presidente do Conselho Municipal do Idoso, Tinciane de Medeiros, não vê como saída para o problema a internação em abrigos. Ela acredita no trabalho em família, no fortalecimento da afetividade e da responsabilidade para superar o problema.

Mesmo assim, a cada dia aumenta em Quixeramobim a fila de espera na porta da Casa do Ancião, mantida pelo Instituto Sorelle Della Misericórdia Di Verona. Atualmente acolhe 34 deles, na faixa etária dos 70 aos 95 anos. Outros 10 aguardam vaga no único abrigo da região. A assistência, considerada um modelo nacional, é mantida através de convênios com a Secretaria de Ação Social do município, Governo Federal e doações. A diretora, freira Ernestina, confirma a carência para o amparo. Para atender a demanda, será necessária a ampliação do Lar São Vicente de Paulo, como a Casa também é conhecida, ou construção de outros abrigos.

Apesar da assistência pública e das doações, a Casa do Ancião trabalha praticamente no vermelho. Mas não há como recusar atendimento aos casos mais graves. O caso de uma aposentada de 94 anos, abandonada pela família dentro da própria casa, é um deles. Segundo a missionária, a juíza de Direito da comarca, Maria José de Alencar, determinou a perda de guarda da anciã e a internação no abrigo mariano.

Não bastasse o abandono, os casos de violência física começam a surgir nas delegacias. Em Quixadá, do início do ano para cá foram registrados quatro casos, o suficiente para os policiais confirmarem a existência de novas modalidades de crimes, dos psicológicos aos econômicos. O estudante de Psicologia Adriano de Souza concluiu estudo acadêmico sobre esta vulnerável faixa etária. Concluiu como maior mágoa de quem já passou dos 60 o menosprezo social, a rotulação de "incapaz". Ele citou como exemplo as visitas ao banco. Apesar da necessidade da presença do beneficiário para receber a aposentadoria ou pensão, geralmente o funcionário se dirige ao acompanhante e não ao titular da conta. "O desprezo também fere", disse.

AÇÕES PROATIVAS

Reinserção melhora qualidade de vida

Juazeiro do Norte.
Maus-tratos e aprisionamento de bens são denúncias que chegam com freqüência no Conselho Municipal do Idoso. Desde que foi criado o Estatuto do Idoso, há cerca de seis anos, algumas coisas mudaram. O problema é que ainda existe um desconhecimento muito grande, tanto da sociedade como dos próprios idosos, a respeito dos direitos e deveres desses cidadãos.

Segundo o presidente do Conselho, Antônio Marcelo das Neves Bezerra, essa realidade tem mudado aos poucos. Mesmo com um trabalho de divulgação, o alcance das informações sobre os diretos dessas pessoas ainda não é suficiente. Mas o conselheiro faz uma avaliação positiva sobre as denúncias que chegam até a sala dos conselhos na Secretaria de Assistência Social.

Para ele, as pessoas que chegam a denunciar já têm o conhecimento da presença de um órgão de defesa e, conseqüentemente, das leis que defendem a pessoa idosa. Mas ainda falta um trabalho de reinserção do idoso, para que ele se sinta mais ativo na sociedade. Marcelo cita exemplos de trabalhos que são desenvolvidos por meio dos órgãos públicos e privados, no sentido de dar assistência, mas ressalta a necessidade desses trabalhos não estarem voltados apenas para lazer e depois servir lanche. "A assistência à pessoa idosa está além dessa realidade e as pessoas precisam ser capacitadas e reinseridas no mercado, com aproveitamento do seu potencial e experiência", acentua.

Ele cita como exemplo o Sesc deste município. Cerca de 80% das pessoas que estão inscritas na hidroginástica são idosos, que vêm buscando qualidade de vida. Além disso, foi criado um grupo de teatro somente com idosos, além de outro grupo que tem feito recepção de grandes eventos como a Feira de Tecnologia e Calçados do Cariri (Fetecc). "Foi um bom momento e uma demonstração de que o trabalho dessas pessoas agrada em cheio o público. Eles passaram até por um treinamento", diz.

Quanto à assistência realizada por meio do conselho, que atualmente atua sem sede mas acolhe as denúncias 24 horas por dia, ele afirma que são feitas as visitas, fiscalizações e autuações junto com advogados e assistentes sociais. O conselho também atua quando há a necessidade de um laudo, encaminhamentos para órgãos como o Centro de Referência Especializado em Assistência Social (Creas), que dão assistência à família.

Mais informações
Núcleo de Atendimento ao Idoso
Rua 21 de Abril, S/N
Bairro Prado
Fone: (88) 3510. 1650


HONÓRIO BARBOSA
REPÓRTER